“...
há uma sugestão que funciona como um grão de poeira que, suspenso no ar, irá
convocar uma gota de chuva. Antes da obra, o que existe não é senão um
nevoeiro. É crucial que não seja possível ver o caminho. É preciso, sim, adivinhar
o destino...” (COUTO, p.3).
Essa é sem dúvida uma
das melhores expressões para se descrever como se inicia meu processo de criação;
seria uma comichão, a inquietação, a provocação há algo incerto, sem forma ou
sem manual para. Nas poucas vezes que sou compelida por essa poeira, que por um
bom tempo vaga flutuante por minha mente, sua própria observação é lenta, sendo
pouco a pouco reforçada. Nesse espaço, outras coisas vão acontecendo, vou me
dedicando a outras coisas, tidas por obrigações, e algumas ações vão reforçando
a forca daquela poeirinha flutuante ali perdida.
“A incerteza é tida como uma falha no conhecimento. É uma
carência geradora de medo.” (COUTO, p. 5).
E assim poeiras vem e
vão, algumas persistem outras se dissipam e são esquecidas em desejo e memória.
Me falta talvez a ignorância sugerida por Mia Couto para ser preenchida pelo anseio,
pela imprevisibilidade, pela desordem. Minhas falhas e impotências estão aí, em
não permitir ou deixar fluir alguns dos meus caminhos para a criatividade e
produção. E não considero isso um bloqueio criativo, pois não é por falta de
provocações ou ideias é falta de atuação.
Estou passando por
algumas mudanças de compreensão e olhar para minha criação, hoje enxergo
possibilidades antes nunca observadas. Mas meu caminho para criar algo se dava pela
influência de alguma referência, seja algo que me instigou e produziu uma ideia
(a poeira) ou a vontade o desejo por aquela produção especifica. Apesar da variação para a criação, o caminho
era o mesmo. Não sabia o como fazer ou o que usar (o nevoeiro), eu só visualizava
a ideia projetada; todo o resto é descoberta. No desenrolar das ações o caminho
vai se mostrando e revelando o que deve ser feito após.
E nesse caminho sou tomada
pelas surpresas que a curiosidade me concedeu, assim como a gratificação do realizável.
Todo o processo são afirmações inconscientes do prazer e satisfação em estar
ali, fazendo, participando, criando, transformando, tornando real e visível.
“Esse tempo primordial de
indefinição, essa travessia pelo desconhecido é um dos mais saborosos momentos
do labor... Esse é o momento divino em que tudo pode ainda ser.” (COUTO, p.3).
Tudo
pode ainda ser ... até o eu artista.